My personal story
R: (…) In fact, as the years went by, some situations occurred, few, in my point of view for what it’s possible to happen. There are some situations in which we even ask between the lines if there is the possibility of… but no. These situations are all disguised with falls, different traumas; people don’t assume it and they go there because of the discomfort and pain they feel, instead of pressing charges. Perhaps I’ve seen much more women, although in a small number, but comparing male and female, there were more women confirming that they were domestic violence victims than men. Maybe, in my whole professional path, I had, that I remember, 2 men that, difficultly and ashamedly, confirmed they were victims of domestic violence and that they wanted to press charges. (…) But, in fact, there is that fear of shame and it’s more for men than for women. Even we, health professionals (…), we can’t judge, but sometimes between us we let become visible a little bit that it’s more usual for women, and it isn’t so hard for us. And when a man comes up in these situations and he complains, we are like: “How is this possible?”, and we joke a little bit, well, it’s our own defences (for the hard work they do and the situations they deal with), between the team unit we joke a little bit and say: “how is it possible that the man let himself be beaten by his wife?”. And, in fact, if it is a woman, this doesn’t happen. In fact, there is a big difference between men and women here.
I: So, is there a more understanding attitude if a woman shows up than if it is a man?
R: Yes.
I: Why do you think that happens?
R: Maybe it’s the habit, let’s say that, and the mentality that people still have. And it has also to do with the media, because it always let become visible, when it talks about it, that the situations of domestic violence are always done by men against women, women appear hurt and women appear dead, and, in fact, it doesn’t talk too much about men and it actually happens (to them). (…) Because there are many men that, due to the discomfort that society, friends, neighbours will instil them, close themselves more and, maybe, they live their whole life suffering from domestic violence and don’t tell it because of the burden that comes next. And for women it’s a more common situation, they don’t mind of revealing it and try to change the situation.
(…)
I: Is it important in this story the fact of you being a woman?
R: Maybe it is… in what women are concerned, the fact of being domestic violence victims, the fact of telling more easily to a female nurse than a male one. Perhaps for shame, let’s say so, of the connotation that society gives… and for men it’s even worse! A man going to (name hospital unit) to tell that he was a victim of domestic violence to a male nurse… I don’t know if it happens, because we don’t talk too much about it and it’s not a situation that allows talking due to the professional secrecy. Although, in my opinion, bearing in mind the situations that we perceive, in this special cases, maybe they’ll feel much more comfortable talking with a woman, because they think that she will understand better the situation and because of the society connotation of this being a shame. So: “I won’t tell a man that my wife hit me!”. And in this aspect they’ll have more difficulty, but it doesn’t mean that they won’t do it.
I: Do you think that if it was a male nurse they wouldn’t feel comfortable?
R: I do.
Portuguese
I: E agora seguindo também um pouco a linha do teu trabalho, há pouco estávamos a falar que já viveste, já presenciaste situações em que… de casos de violência. Queres-me falar um pouco sobre isso?
R: Continua, de facto, essa problemática da violência doméstica, continua a ser realmente muito mascarada e muito difícil, mesmo nós profissionais de saúde, tentarmos perceber o que é que está a acontecer, principalmente no serviço de (nome serviço hospitalar), em que nós não conhecemos, à partida, a pessoa, não é? E, de facto, há uma grande relutância das pessoas se... confirmarem, digamos assim. Porque vão à (nome serviço hospitalar) com sintomas vários de dores no corpo, de cefaleias, com hematomas, etc. e, de facto, nós não o podemos afirmar, não podemos obrigar a pessoa a dizer, como é óbvio, mas o olho clínico, digamos assim, nos leva a que a gente pense que seja violência doméstica. De facto, ao longo destes anos, apareceram algumas situações, poucas, no meu ponto de vista, para aquilo que eu acho que é possível. E há situações em que nós até perguntamos nas entrelinhas se não há possibilidade de... mas não. São sempre mascaradas com situações de quedas, de traumatismos vários em que as pessoas não assumem e vão lá mais pelo desconforto e pela dor que sentem, do que propriamente para fazer queixa. Tive, se calhar, muito mais mulheres, embora um número reduzido, mas em termos de sexo masculino ou feminino, muito mais mulheres a, digamos, a confirmarem que "sim", que foram vítimas de violência doméstica do que homens. Se calhar, neste percurso de vida profissional, tive, que me lembre, dois homens que, a grande custo e com grande vergonha, que assumiram que foram vítimas de violência doméstica e que queriam apresentar queixa. Porque, às vezes, também o que é que acontece? As pessoas vão, dizem o que é que aconteceu, precisam de ajuda, mas não é ajuda para resolver o problema, é ajuda para os tais hematomas, as tais cefaleias, etc. Quando nós dizemos: "Mas olhe que a legislação está assim, assim, assim, temos um gabinete de medicina legal para observar as suas lesões, para apresentar queixa" e não querem. Agora o porquê? Não é? Ali também é difícil um pouco o nosso papel, já é mais do cuidar, o resto já não tem muito a ver connosco. Mas, de facto, também é aquele medo da vergonha e muito mais para o homem do que para a mulher. Mesmo de nós, profissionais de saúde, que tem que se ser um pouco, embora transparentes, mas não podemos julgar entre nós, às vezes, deixamos transparecer um pouco que parece que a mulher é mais habitual e, então, já não, já não nos custa tanto. E o homem quando vai nestas situações e se queixa, até nós somos um pouco: "Como é que é possível?" e brincamos, às vezes, um pouco, também é uma defesa nossa, entre nós equipa, brincamos um pouco com isso e dizer assim: "Como é que é possível o homem deixar-se bater pela mulher?". E, de facto, a mulher já não acontece o mesmo. De facto, nisso há uma grande diferença entre o homem e a mulher.
I: Portanto, acaba por haver uma maior compreensão se aparecer uma mulher vítima de violência do que se aparecer um homem?
R: Sim.
I: Mas por que é que achas que isso acontece?
R: Se calhar foge-nos um pouco ao hábito, digamos, e às mentalidades que as pessoas ainda têm. E também muito a ver com a comunicação social, porque a comunicação social deixa sempre transparecer, quando se fala nisto, que são sempre casos de violência doméstica por parte dos homens em relação as mulheres e que há mulheres que aparecem magoadas, e que há mulheres aparecem mortas, e, de facto, não se fala muito nos homens e que, de facto, acontece. Não sei, se calhar, exactamente, também não temos acesso a um número concreto, mas, se calhar, pode ser, eventualmente, um maior número mas também se deveria falar muito da parte dos homens. Porque há muitos homens que depois, também pelo mal-estar que a sociedade lhe vai incutir, amigos, vizinhos e, então, fecham-se mais e, se calhar, andam uma vida inteira a sofrer de violência doméstica e não o dizem por depois pela carga associada que daí advém. E as mulheres, como já é uma situação mais comum, já não se importam tanto de revelar e de tentar mudar a situação.
(…)
I: E o facto de seres mulher nesta história é importante?
R: Se calhar é importante no aspecto de... de... no caso das mulheres, serem elas as vítimas de violência doméstica, o contarem mais facilmente a uma enfermeira do que um enfermeiro. Se calhar, pela vergonha, digamos assim, da conotação que a sociedade dá que... então os homens pior! Um homem ir à (nome serviço hospitalar) contar que foi vítima de violência doméstica a um enfermeiro... não sei se acontece, não é, porque também não falamos muito nisso e também não é uma situação que se, a nível do sigilo profissional, que se converse, mas, digo eu, que pelas algumas situações que a gente se apercebe que, nestes casos pontuais, se calhar, se sentiriam muito mais à vontade de ser uma mulher, porque acham que percebe melhor a situação e pela conotação da sociedade, e que é uma vergonha. E então: "Eu não vou dizer a um homem! Que a minha mulher agora me bateu". E, então, aí, só nesse aspecto, não quer dizer que não o faça, mas, se calhar, têm mais dificuldade em...
I: Achas que se fosse um homem que não se sentiriam à vontade para o fazer?
R: Acho.
I: Mas... porquê?
R: Por isso que eu te digo, pela conotação de um homem... a sociedade, embora eu ache que está cada vez menos vinculada a esta situação, mas o homem tem sempre aquele ar mais... mais másculo, mais forte, mais seguro, mais... e a mulher menos, mais frágil... e então, o eu assumir que sou homem e dizer que fui vítima de violência doméstica pela minha mulher; certamente se há outro homem que ouve isto, não é? Que me vai achar muito fraco, muito frágil. E, então, se disser a uma mulher, ela deve perceber melhor, porque as mulheres já vivem mais violência doméstica. Eu acho que é por aí. Mas, se calhar, é o que eu te digo, se calhar, estou, não sei se estou a ser muito certa no que te digo, é a leitura que eu faço de algumas situações que vejo, até por alguma vergonha em dizerem a uma enfermeira ou ao enfermeiro. Mas, de facto, só alguns colegas poderiam ver se bate certo aquilo que eu estou a dizer, mas é a ideia que eu tenho.
Gender did matter